Teatro Escola Macunaíma on mar 23, 2022
O professor doutor Pedro Cesariano conversou com a equipe do Macu sobre “A inter-relação cultural”. Ele foi convidado a falar sobre suas investigações para fomentar a construção do tema de pesquisa do 1º semestre de 2022: Arte & Vida: O Sistema Stanislávski como Meio para Manter as Relações Vivas. Geradora de muitas ideias, registramos uma síntese de sua fala neste artigo.
Pedro cesariano é graduado em Filosofia pela Universidade de São Paulo, mestre e doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro. Desenvolve suas pesquisas em etnologia indígena e é, atualmente, professor do Departamento de Antropologia da USP.
Para além de sua trajetória intelectual, Paulo Cesariano mantém fortes laços com a prática teatral. E isso se faz nítido em sua colaboração com a Cia. Livre de Teatro, fundada em 20002, que estreou – não faz tanto tempo – o seu emblemático Arena Conta Danton, releitura da peça A Morte de Danton, do alemão Georg Büchner (1813-1837), inspirado no Sistema Coringa de Augusto Boal.
Caminhando cada vez em direção a (pós-)modernidade, a Cia Livre de Teatro estabelece sua parceria com Pedro Cesarino, de acordo com cursos e palestras. Essa sinergia, então, ganha expressão cênica com a peça Raptada pelo Raio (2009/11), livre recriação do antropólogo de um mito do povo Marubo.
Mais recentemente, Pedro Cesarino transforma em peça teatral outra narrativa do povo Marubo em processo colaborativo com a Cia. Livre de Teatro. O espetáculo, intitulado Cia. Livre Canta Kaná Kawã, estreou em 2014 na sede no grupo, localizada no bairro Campos Elísios em São Paulo.
Procurando estabelecer uma conexão com nosso tema de pesquisa – Arte & Vida: O Sistema Stanislávski como Meio para Manter as Relações Vivas – Paulo Cesarino iniciou sua fala fazendo um balanço do momento atual. Em síntese, para ele, estamos vivendo um tempo de negação deliberada das políticas para a diversidade, que buscam possibilidades de inclusão e participação social das “minorias”.
As transformações geradas pelas ações afirmativas – entre elas, o estabelecimento de cotas para os estudantes universitários –, viabilizaram uma significativa mudança no cenário cultural. Bem como, a reação agitou-se. A pandemia, por fim, só fez agravar o que já estava em curso, ao intensificar a precarização da vida.
Assim, para Cesarino, a efervescência das identidades, ao questionar, por exemplo, as relações de gênero, teria “chacoalhado” a maneira como foram construídas as nossas narrativas sociais. O que, ao contrário, acabou por despertar a ira dos representantes da formação colonial brasileira, que reagem hoje com força.
Contrariando a fundamentação de alguns de nossos mais respeitados intelectuais, Pedro Cesarino considera que as políticas indenitárias se desvinculam da lógica estadunidense. Assim como tais reinvindicações de direitos, ao adquirirem uma forma particularizada no Brasil, guardam nossa esperança revolucionária. Ou seja, nenhuma outra em nossa vasta e longa história, teriam sido capazes de alterar os pilares a partir dos quais pensamos a cultura brasileira.
Contudo, Pedro Cesarino não deixa de apontar a perversidade de nossa elite – classe dominante? – como responsável pela manutenção do estado de violência em que vivemos. Nesse sentido, pelo genocídio dos povos indígenas. Cabe mencionar que a questão da terra, no Brasil, nunca foi questão pacífica e que alguns de nossos artistas da década de 1960 pagaram com a vida ao contestarem a propriedade privada.
Enfim, Cesariano voltou a seus temas diletos com o “lugar de fala” e o definiu como o se posicionar de acordo com o seu contexto. Essa colocação enseja que nós, educadores, reflitamos sobre os nossos desejos de sedução dos educandos e que evitemos o caminho fácil, que prescinde da historicização. Acima de tudo, isso é para que não sejamos levianos, bem como responsáveis com a nossa tarefa de educadores e historiadores do futuro.
Por fim, sua fala traz algo de muito interessante sobre suas experiências concretas com outras culturas, ao abordar especificamente o modo coletivizado de organização indígena, em que o coletivo e não o indivíduo é preponderante. Esse, de fato, parece ser um exemplo para a reavivação de nossas relações! Afinal, em uma sociedade onde o público perdeu cada vez mais espaço para o privado, o desafio de se pensar coletivamente nos parece uma provocação a ser levada a sério pela arte e pela vida!