Daniela S.T. Merino participou de uma das reuniões semanais do Macu, falando sobre o sonho de Evpatória. Merino é doutoranda da FFLCH-USP e autora do livro Sulerjítski: Mestre de Teatro, Mestre de Vida: Sua Busca Artística e Pedagógica, (Perspectiva / CLAPS, 2019). Sua fala visou fomentar as pesquisas sobre o tema de investigação criativa deste semestre – Dos Sonhos Que nos Movem – Imaginar – Agir – Comunicar.

 A organização dos estúdios

Daniela S.T. Merino começou pontuando a importância dos estúdios, que representaram um fenômeno cultural na Rússia do início do século XX. Eles pressupunham não só a união de pessoas com fins criativos, mas a ideia de uma comunidade com aspirações comuns. Aspirações estas não apenas artísticas, mas também humanas.

Além disso, é bastante emblemática a constituição Primeiro Estúdio do Teatro de Arte de Moscou, fundado em 1912, por Stanislávski, Sulerjítski (Súler) e Vakhtângov. Organizado com objetivos diferentes de um teatro de espetáculos, condicionado pelo produto final, o Primeiro Estúdio tinha como estímulo as experimentações e descobertas no campo da criação cênica.

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Porém isso não quer dizer que, no Primeiro Estúdio, não se produzissem peças a serem compartilhadas com o público. Afinal, a Comunicação também é uma etapa importante quando entendida como parte do processo criativo. E, sem perder o caráter laboratorial, quatro espetáculos foram apresentados neste contexto.

Entre estes espetáculos, destaca-se aqui O Grilo na Lareira (1914), peça adaptada de The Cricket on the Hearth, de Charles Dickens. Sobre esta montagem, Merino comenta: “Seguindo os princípios tolstoístas […], a encenação se propunha a negar a guerra tendo em conta a exposição de conceitos como a fé na ingenuidade, a piedade e o triunfo do bem” (https://periodicos.uff.br/cadernosdeletras/article/view/44115/25197).

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Como resultado, pode-se observar que o pensamento de Tolstói – ferrenho opositor das batalhas entre nações – inspira os princípios éticos do Primeiro Estúdio. E, entre estes princípios, inaugura-se a figura do diretor-pedagogo, com vistas à construção conjunta do conhecimento. Portanto, uma relação de horizontalidade se estabelece entre este e os alunos, a qual ainda é permeada pela amizade e por um profundo afeto.

Evpatória: Uma utopia plausível

Em conclusão as considerações acima, Daniela S.T. Merino chegou ao seu tema principal: O sonho ou o Estúdio de Evpatória. Dessa forma ele assim ficou conhecido, pois Stanislávski comprou, à beira do Mar Negro, perto de Evpatória, um terreno onde Súler poderia trabalhar ligado à terra. A ideia era conceber uma comunidade afastada da realidade citadina, moscovita, motivo pelo qual o lugar recebeu o nome de “Robinson”, em referência ao náufrago Crusoe.

Então, o Estúdio de Evpatória viabilizou a reconexão com a natureza e uma total liberdade de criação. Súler, que se fundia com a atmosfera do lugar, propunha aos atores, brincadeiras próprias àquele contexto, todas pautadas por uma crença absoluta no “Se” Mágico. Além disso, por outro lado, ele também distribuía tarefas entre eles, que acordavam cedo e gerenciavam o espaço, limpando, cozinhando etc.

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Súler, definitivamente, acreditava na harmonia da vida, na transformação do mundo e, junto com Stanislávski, se esforçou por concretizar e partilhar este sonho. Assim, Daniela S.T. Merino trouxe uma concepção de utopia relacionada a este ideal, a qual se configura como recusa do presente e tem caráter coletivo, ao mesmo tempo em que se mostra plausível de realização.

E por fim, para encerrar sua fala, nos deixou algumas provocações, que não cabem somente a nós, diretores-pedagogos do Macu, mas a todos os educadores, de qualquer área do conhecimento: afinal “Qual é a nossa Evpatória, o nosso refúgio? No meio desta pandemia, será que conseguimos ter alguma? Se sim, como levar os alunos até ela?”

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